Nem sempre o aleitamento materno foi valorizado. No final da idade moderna, durante o século XVIII, os índices de mortalidade infantil elevaram-se na Europa, facto este que se justifica habitualmente com a entrega das crianças aos cuidados das amas-de-leite. A citação seguinte refere-se aos costumes das mulheres privilegiadas da China (antes da revolução cultural comunista), mas podia aplicar-se às mulheres europeias, de maior nível sócio-económico, que viveram durante o século XVIII:
O corpo de Meng tinha sido feito para dar à luz e os seios dela tinham estado cheios de leite. Mas ninguém, nem sequer ela, tinha sequer pensado em deixar que o bebé puxasse os seus encantadores pequenos seios, estragando a sua firmeza. Lien fora contratada para fornecer leite. Ela era a jovem mulher de um dos agricultores das terras da família Wu. O seu próprio filho tinha sido alimentado a farinha e água e papa de arroz pela avó, em vez do leite da mãe. Por isso, agora era magro, pequeno e amarelo, ao passo que a criança de peito era gorda e rosada. Lien podia ir a casa uma vez por mês e, quando via o filho, chorava e colocava-o junto dos seus grandes seios. Os seus peitos cheios pingavam leite, mas a criança virava a cabeça. Ele nunca provara aquele leite e não sabia como mamar. Lien nunca conseguia ausentar-se durante todo o dia, por causa dos seus seios doridos. A meio da tarde, tinha de voltar à pressa para a casa da família Wu, Ali, a criança que ela amamentava estava à sua espera, gritando, furiosa e com fome.
Quando a avistava, ela esquecia a criança amarela e magra. Abria os braços, rindo, e a criança grande e gorda gritava por ela, sentada nos joelhos da mãe. Então, Lien corria na sua direcção, abrindo rapidamente o casaco. Ajoelhava-se perto dele, ao lado de Meng e, com as duas mãos, a criança agarrava firmemente o peito dela como se fosse uma taça e bebia em grandes goles.
Gradualmente, deixara de amar o seu próprio filho. Todo o seu rico amor animal fora transferido para o seu filho de peito. A sua casa era pobre e a vida lá dentro era dura, a comida escassa. A sogra tinha uma língua afiada e cobiçava os salários que Lien trazia para casa. Apesar de, em tempos, Lien ter amado a sua própria casa e ter chorado durante todo o dia e toda a noite quando a mãe do marido a mandara para a Casa Wu, acabara por gostar da boa comida, do conforto, da ociosidade. Para lá de alimentar aquele rapaz saudável, nada mais lhe era exigido. Era instigada a comer, a beber, a dormir. O seu corpo jovem e amante do prazer respondia rapidamente. Agora esta era a sua casa e ela amava a sua criança de peito mais do que o seu filho.1
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As mulheres das classes altas que entregavam os seus filhos ao cuidado das amas de leite faziam-no por acreditar que era o melhor para eles e para si, pois a prioridade social era manter as relações conjugais, em detrimento do exercício das funções parentais. O conceito de amor, tal como o concebemos hoje, ainda não tinha sido inventado e as crianças eram comparadas aos adultos e consequentemente encaradas como seres insignificantes e, portanto, indignas de amor materno.
Todavia, no Ocidente, a formação e consolidação dos estados nacionais, desencadeadas pela revolução francesa e, no final do século XVIII, a urbanização e a revolução industrial, que criaram condições para o desenvolvimento económico do século XIX e originaram o aparecimento de uma nova classe social, constituída pelos operários, juntamente com aspectos relacionados com um maior envolvimento do Estado nos assuntos da vida privada das famílias, a medicalização do nascimento e da alimentação infantil e ainda o próprio desenvolvimento da indústria alimentar, já em pleno século XX, vieram criar novas necessidades no que diz respeito à alimentação dos bebés.
Só mais tarde o papel central da mãe na alimentação dos recém-nascidos foi recuperado e assiste-se, já neste século, a uma crescente sensibilização da sociedade relativamente às vantagens do aleitamento materno, que o aparecimento de organizações não governamentais, um pouco por toda a Europa - que fazem da promoção do aleitamento materno a sua principal batalha - tem vindo a reforçar.
No centro do movimento social que reabilitou a amamentação está a mãe da criança (que a ama) e, nesse contexto, todos as iniciativas que promovam a sua informação, saúde, equilíbrio emocional e apoio, em particular às mulheres que são mães pela primeira vez, são actualmente incentivadas e aprimoradas.
O reconhecimento precoce de sintomas de ansiedade (patológica) ou de sintomas depressivos na mãe do recém-nascido tem por isso sido o foco de muita investigação realizada no âmbito da saúde mental nas últimas décadas e por isso hoje há informação científica de boa qualidade que permite estabelecer uma relação causal entre doença mental e insucesso da amamentação.2
As relações entre as alterações emocionais perinatais e a amamentação foram objecto de uma comunicação realizada no Congresso Nacional de Aleitamento Materno, que decorreu nos dias 26 e 27 de Maio de 2014.

1. Pearl S. Buck (2007). Onde Mora a Felicidade. Alfragide: Texto Editores
2. A doença mental é aqui considerada na sua forma mais lata, que inclui os casos de gravidade ligeira a moderada e por insucesso da amamentação designa-se quer a situação em que ela é prontamente substituída pela alimentação artificial quer o caso em que o período de amamentação tem uma duração inferior àquela que era a expectativa da mãe, antes do parto.