Comemorou-se no dia 18 de Outubro o Dia Mundial do Médico. Ao que parece, esta tradição tem origem cristã e a Igreja Católica comemora o dia de São Lucas a 18 de Outubro. Trata-se de um santo que nasceu numa família pagã, que foi convertido ao cristianismo por São Paulo e que foi médico e pintor, sendo por isso considerado o padroeiro dos médicos.
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No passado dia 18 de Outubro fui surpreendida por uma avaria no carro, quando me deslocava na autoestrada do Sul, no sentido Norte-Sul, para ir fazer consultas em Setúbal. Faltavam cerca de dez minutos para as 13 horas quando fiquei parada na berma da autoestrada, de estômago vazio, à espera do reboque para o carro e de um táxi que me levasse até à cidade.
Estive à beira de um ataque de nervos, ao ver o tempo a passar, percebendo que ia deixar uma pessoa a aguardar por atendimento durante os sessenta minutos seguintes. Na verdade, o que me incomodava mais era saber que as pessoas com quem me comprometera a encontrar durante essa tarde, a horas determinadas, iam ficar à minha espera, sem que eu o pudesse evitar. Sentia-me impotente para cumprir o que tinha acordado com elas antecipadamente.
Felizmente, consegui atrasar-me apenas uma hora e acabei por ver a paciente das 13 horas às 20 horas, tendo observado os restantes pacientes nas horas previstas. Fi-lo com sacrifício próprio, pois acabei por só ir “almoçar” rapidamente, a meio da tarde, entre consultas.
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Ao longo da minha vida profissional na Psiquiatria sempre me chamou a atenção o facto de alguns dos profissionais com quem me fui cruzando apregoarem a importância do estabelecimento de uma relação terapêutica com os pacientes, privilegiando um horário e um espaço rígidos para se encontrarem com eles, sendo que na prática do dia a dia revelavam ser muito mais flexíveis consigo próprios, sempre que lhes surgia um compromisso que entrava em conflito com o que haviam contratado previamente.
Há dias deparei-me com um cartaz publicitário na rua, que dizia o seguinte: “Nem toda a inteligência é artificial, todo o cuidado é C..” Na altura pensei que o marketing da empresa de prestação de serviços de saúde em causa era bom, mas que a frase deveria terminar de outra forma: nem toda a inteligência é artificial, a dos médicos é insubstituível. De facto, ao contrário do meu carro, não há peças que, uma vez trocadas, possam garantir a minha presença numa consulta. Nem programas informáticos que possam competir com a minha capacidade de adaptação aos imprevistos. Por essa razão, faz sentido dedicar um dia do calendário anual aos médicos que, como eu, fazem toda uma ginástica pessoal para atender as necessidades dos seus pacientes.
E é também por isso que concluo esta crónica afirmando o seguinte. Nem toda a inteligência é artificial; no caso do médicos, ajudar faz parte do ADN. Está no nosso ADN tratar, cuidar ou simplesmente ajudar. E isso é específico desta profissão, nenhuma outra se comparando em grau de responsabilidade ou na entrega com que os médicos se comprometem com os seus doentes, desde o dia em que ingressam nas faculdades de Medicina, por esse mundo fora.